31 de mar. de 2008

O Encontro

Depois de uma longa viagem pelos lugares do Sul, regresso… regresso exultante dos cheiros, dos sabores, do silêncio, da descoberta, da amizade…
Em quase10 dias percorri alguns dos lugares mais perenes e secretos do Sul: Silves, a cisterna da Moura Encantada e a antiga mesquita de Santa Maria de Faro ou as ruas e ruelas de Tavira onde apreciei o peixe ao luar naquela terra suave que foi Comuna de Pescadores no período derradeiro das terceiras Taifas. Depois a estrada deslizante entre as serranias, deixando a ponte do Guadiana e Huelva para trás, à direita. E, já depois de ter passado a saída para Alcoutim, surge uma tabuleta à esquerda: Mesquita. Travo leve, ligeiro, subtil como os barcos que há mil anos subiam o rio e percorro uma estrada estreita que me leva a uma pequena aldeia perdida nas serras, já não muito longe do Guadiana. Contemple-a, percorro-a e começo a descer uma estrada de terra batida; perco-me nos campos sorvendo a plenos pulmões o odor e a luz das estevas – papoilas de estevas, chamou-lhe o Adelino, e ele sabe do que está a falar, ele que foi pastor e manteve ao longo dos anos essa ligação e serenidade que a Terra e as noites passadas debaixo da Lua nos dá – fico ali, embebedando-me de silêncio… a tal ponto que esqueço as horas, mas como há males que veem por bem, de repente vejo-me em Mértola a comer queijo com pão e a beber vinho na única mesa da esplanada de uma tasca onde não ia à muito.



Tenho o castelo defronte, a poucos metros o amigo arqueólogo Jorge Feio coordena uma escavação. São quatro da tarde, o Sol aquece-me o corpo depois de uma manhã em que as nuvens teimavam em tapar o céu, estou num dos lugares mais bonitos do mundo, e… de repente surge, quase cambaleante o velho pintor-filósofo Mário Elias que se senta comigo e… me fala de ópera, de canto lírico, dá exemplos e… eu recordo-lhe como cantou no 3º aniversário do CEDA e na Evocação de Pedro Ferro, na “Cavalariça”, em Entradas, foi a… 18 de Maio, momento que ficou registado na Memória Alentejana assim:

“E com as cordas vocais afinadas pelo poejo verde alguns sócios fizeram a evocação dos cantares do nosso Alentejo. Mas a arte foi de Mário Elias. Que tenor!”.

Um regresso a casa… sentado, fumando, à soleira da porta, esperando!...


Depois de um fim de tarde na Biblioteca de Beja em busca da memória de Al Mouhatamid Ibn Abbad janto com o amigo antropólogo e poeta José Orta, falamos de poesia e de novos projectos e faça-me de novo à estrada…

No dia seguinte visito apiários com o meu amigo Alex Pirata, tenho uma visão e na manhã do outro dia seguinte encontro a Nina, a sua simpática esposa - agora a atravessar um momento difícil – com quem tomo o pequeno-almoço. A Páscoa aproxima-se, e passo a tarde desse dia em companhia do Mestre das plantas, o jovem José Salgueiro, com apenas 89 anos, a identificar plantas nas margens do rio Almansor, ali para os lados da Barragem dos Minutos e … percorro os montes com o sr. Isidro Rebocho, apicultor e proprietário de uma melaria, preparando “o terreno” para um passeio em Maio.




O dia seguinte é o Dia Mundial da Poesia. Falo e ofereço poesia. Aos amigos. Ao Manel Casa Branca, à Ana, que ficou maravilhada e divulga a todos os comensais o exemplar de Flores da Planície que lhe ofereci, e ao anoitecer vou-me abastecer de mel e de afectos enquanto saboreio aquele licor de poejo único que só o Alex tem.

No sábado parto a caminho do Pomarão. Em Ferreira, encontro a Céu e a Marta, que com o seu vigor de oito anos passa a viagem a jogar à sardinha comigo. Aquele visão única do último porto do Mediterrânico surge de repente e elas ficam boquiabertas e percebem porque valeu a pena a viagem. E depois foi saborear os peixes do rio: a lampreia, as enguias, o bom vinho branco... e o reencontro com a Guika e outros amigos.


No regresso, ao parar frente ao Café Guadiana, e depois vislumbrando a Mesquita no caminho empedrado para a Torre do Relógio recordo o abraço que o Mestre Amigo Cláudio Torres me mandou pesaroso por não estar para almoçarmos e… navego até mais ao Sul, lugares secretos Tânger, Marraquexe –de que nos fala demoradamente o Amigo Cônsul José Alberto Alegria - para onde ele vai no dia seguinte onde tem a sua casa de férias -naquela agradável encontro no domingo anterior no seu atelier de arquitectura – Darquiterra - em Albufeira.


Navego para Sul, no tempo: Beja, Silves, Sevilha, Tânger, Rhmat… regresso de novo a Silves.. é um dia suave de fim de tarde, todavia frio e com vento. Dois homens esbeltos passeiam nas margens do rio, um mais jovem… o seu ar exterior elegante revela uma condição nobre. De repente o mais jovem, olha para o céu e depois para o rio, para as suas águas encrespadas pelo vento frio e diz ao outro, esperando a resposta:

O vento converte as águas
numa cota de malha…

mal decorre uma breve facção de segundo ouve-se uma voz doce, muito doce:

e que é cota de armas
quando o frio a congela!

uma jovem bela, muito bela, de cabelos negros-vermelhos, com leves fios vermelhos, surge de repente. A sua pele é macia, muito macia e clara, a sua boca é uma romã e o seu olhar é um clarão vindo do início dos tempos, os seus olhos são lâmpadas de Aladino que fixam o jovem senhor olhos nos olhos…


O jovem Príncipe treme e… o seu rosto abre-se num sorriso de plena felicidade. Olham-se demoradamente. Felizes, encantados os dois. O Encontro do seu olhar ilumina o fim de tarde, pára o vento, aquece o ar frio e ilumina toda a cidade, o rio, o Palácio dos Balcões, o castelo avermelhado, até ao horizonte.

Ibn ‘Ammâr surpreendido e inquieto pela intrumissão pergunta-lhe:

Que tendes senhor?

Mas ele não o ouve. Apenas vê a jovem, linda. E é a ela que se dirige:

És tão linda…como te chamas?

I’timad senhor…

Princesa I’timad… diz-lhe encantado




Nesta minha viagem interior não me dei conta que estava às portas de Beja… e regressei de novo a Silves, ao rio Arade… talvez depois Sevilha… Tânger…

2 comentários:

mariabesuga disse...

ESTEVAS

Olha
Que flor bonita
Cheirosa
Cheira a qu�?
Diz-me tu
A que cheira
E como se chama
� um malmequer?
� uma rosa?
N�o!
Este perfume
� da flor das estevas
Cheira a terra

um beijinho e um poema para a tua primeira fotografia.
apete�o-te tempos felizes!...

perfume de laranjeira disse...

obrigado girassol, pelo teu poema para a minha flor de esteva. Hoje, quase dois meses depois, estas papoilas de esteva - sabes que a papoila e a esteva são os símbolos que eu faria para descrever o Alentejo, são duas flores tão bonitas que juntas... - já estão em quase todo o Alentejo, até no Norte recentemente vi um campo de papoilas.
Tens razão! Apetecem-me tempos felizes!...
Beijinhos para ti